"Acalma a aflição acalenta a alma e silencia"
Liduina do Nascimento - Crônicas e Poemas ❤️
Textos
                     
                  
A marcante procissão
( todas as imagens do goolgle)

 
Recordações de uma vida real, muito pobre,
Uma vida sem muita crença, mas, cheia de amor
e de lindas recordações)



 

Depois de muito choro e muita confusão, para que aceitassem levar a menina cheia de vontades e de vestido cheio de laços, para àquela cidadezinha onde todos os anos era costume acontecer a mesma missa campal, para comemorar o dia de São Francisco das Chagas.
- Ela venceu,
Nos braços do seu pai, ela sem nada entender, satisfeita seguia a multidão que ia caminhando lentamente à sua frente.
Era uma grande movimentação, vozes, cânticos, rezas,
Espalhados pelo caminho, vendas de picolés, pipocas...
Gritaria. A menina não sabia se era uma manifestação de fé ou baderna.
Cansada e sonolenta, ela mentalizava um cântico repetitivo em coro, mais parecendo um lamento, era o fundo musical da procissão, até fazê-la dormir enjoada com tudo aquilo, sem ver o final, só acordando quando já estava de volta para a sua casa,
A sua avó perguntou-lhe se ela havia gostado...
Ela não quis falar sobre o assunto. Queria esquecer àquela manhã junto com a procissão. E ... de todas as suas lembranças de infância, esta vem tão forte em sua mente, que parece estar sendo vivida agora.

 
Deles, a trajetória
 
Os meus pais...
Se não tiveram um casamento programado, nem um amor arrebatador,
para àquela jovem provinciana cujo primeiro amor havia sido sua grande decepção, a insistência do novo amor, à levou para o altar.

Enfim casaram-se,
e logo deixaram a pequena cidade cercada de serras, onde nasceram, saíram sem nenhum filho ainda, foram tentar melhorar as suas condições de vida, buscando outras opções de trabalho na capital, ele,  pedreiro, filho rebelde que não se adaptou ao comando do seu pai, mestre de engenho, acostumado à mandar em seus moradores, à ter a obediência e o controle sobre os outros filhos, este não, preferiu sair das rédeas curtas do pai e ir à fora com a sua esposa, ela era filha única de uma agricultora, com muita dificuldade, havia aprendido à ler e escrever, também aprendeu à costurar.
Ela, junto com o seu marido, trouxera a mãe e seu padrasto, os quatro aventureiros, chegando à nova terra, nada tinham na vida, além de seus sonhos, e mãos calejadas, e uma vontade danada de vencer, chegando na Capital, o máximo que conseguiram foi uma casa de taipa, num lugar com no máximo três vizinhos que ficavam bem distantes uns dos outros, mas trabalhavam para o mesmo patrão.


      Casa de taipa


Ali nasceram os seus dois primeiros filhos, um deles faleceu aos dois anos de idade,
o que causou um grande transtorno para o casal.
Algum tempo depois nasce mais um filho,
e mais outro filho nasceu, dessa vez uma menina, para a alegria do seu pai.
Um ano depois do seu nascimento, faleceu o  marido da avó, que sendo muito jovem ainda, seguiu em frente, morando junto à filha e dedicou a sua vida, aos netos. Agora uma família de seis pessoas, três filhos, o casal e a mãezinha (avó), viúva, que nunca mais se casou, optou em não separar-se da sua única filha. _ A nossa mãezinha... vindo à falecer muitos anos depois, aos noventa e sete anos de idade, com toda a sua lucidez, de certa forma feliz ao ver os seus netos, bisnetos, trisnetos.  A mãezinha era àquela avó que fazia todas as vontades dos seus netos e ainda por cima encobria as suas danações, sim, porque a mãe (era pulso firme)  totalmente o contrário da avó, foi uma grande educadora, que com seu amor, não aceitava falhas e cobrava muito dos seus filhos, porque queria que eles fossem no futuro;
Homens de bem, e ... conseguiu.  A nossa mãe, estava sempre muito séria, trabalhando, mas sempre arrumava um pouco de tempo para brincar um pouco de boneca com a sua filha, fazia vestidos para elas, parecidos com os vestidos que fazia para a sua menina, dona das bonecas.
Não havia outras crianças ao redor, a menina se entretia com os dois irmãos, brincava também de soltar pipa, fabricada por eles, brincavam de arrastar carrinhos de metal, feitos das latas de óleo, ou carrinhos de madeira.
Mas quando silenciava um pouco a noite, ela só sabia chamar pelo seu pai ou pela a sua avó, para lhe contar histórias, antes de dormir, ou então pedia que ele lhe cantasse a mesma música sua preferida, que só era bonita na voz dele, falava de um "Senhor da floresta, um indio guerreiro da raça Tupy, que andava caçando nas matas do rio Chuí..." 
Por aí ia o pai cantarolando até ela dormir. Os seus pais formavam com o tempo, um retrato do amor, eram parceiros, alegres, motivados, empolgados com a vida e com os seus filhos.













          A plantação




Era o costume de todos àqueles que moravam às margens daquele rio, ou mesmo os que moravam um pouco mais distante, em toda época de chuva, plantarem para o próprio consumo, feijão, macaxeiras, batata doce, milho, melancia e abóbora, era impressionante como sem fazerem cercas marcando os espaços, à campo aberto, todos respeitavam as plantações uns dos outros, também se beneficiavam naquele mesmo rio, de pescarias, havia muito camarão, tilápias e outros tipos de peixe, com fartura. Eram dias animados, porquê juntavam-se as poucas pessoas que moravam naquele lugar ainda sem qualquer sinal de civilização, eram todos amigos, que proseavam ao redor do rio contando as suas vantagens de quem pegou um peixe maior ou quem tinha colhido melhor seus legumes, tudo isso ao som das cantigas tristes das lavadeiras de roupas que ali mesmo na beira do rio lavavam suas roupas e também ao sol, nas salsas as estendiam para secar. Dava gosto de ver a plantação, depois a colheita, os adultos se animavam e à noite chegava mais que necessária, porque o cansaço era grande.


            Durante a chuva



_ A estrada na frente da casa dos meus pais, é até hoje muito larga, tornou-se a avenida principal do bairro, trocou de nome por duas vezes, fixou no último nome, somente a alguns anos, dessa feita, uma homenagem.
Naquele tempo a rua era só areia e matagal, quando chovia muito, era tanta água que mais parecia um rio, juntávamos muita areia molhada, fazendo uma barreira enorme atravessando a rua enquanto estiava. Quando a chuva voltava, ficávamos eu e meus irmãos, agora éramos em quatro, havia mais um irmão, o Clécio, que não largava do meu pé, cinco anos mais novo que eu...
A barreira com madeiras ia embora levando a gente, descíamos água abaixo, ouvindo a minha avó aos gritos embaixo de chuva, zangada, nos trazendo para dentro de casa.                
Depois quando o sol voltava, a criançada fazia festa até o final do dia.
A terra estava molhada e firme, bonita, areia branca, marrom, um sonho.
Na frente da nossa casa do outro lado da rua, não havia nenhuma casa, era uma mata fechada, na nossa inocência achávamos que era uma floresta, onde éramos proibidos de entrar.
A minha avó dizia pra não entrarmos por causa das cobras e dos sapos, a menina morria de medo.
De noite era a festa deles, e os seus croachás, e dos grillos, ao longe, que lembrava a serra.
-Onde sempre a minha avó nos levava, outro pedacinho de céu...
Onde até hoje vou para banhar a minha alma de verde e de infância.
Todas as cinco horas horas da tarde,
A minha mãe se levantava da máquina de costurar e nos dava banho, enquanto a minha vó fazia o jantar, então arrumadinhos ficávamos esperando o papai chegar de mais um dia de trabalho. Quando ele chegava, ao longe o avistávamos e era uma carreira só, de dar gosto. Ele nos abraçava com a maior alegria.
Quantas saudades, como é bom recordar.

A menina e os vagalumes



Os poucos vizinhos se reuniam à noite para conversar olhando a lua, nas noites que ela surgia, os vagalumes sumiam, e os meus irmãos guardavam os vidros de prender vagalumes, vazios, chateados.
Quando era noite de lua...
Quando era noite escura os vagalumes se exibiam e enfeitavam as matas,
era uma beleza de dar gosto aos olhos. Hoje, beleza das lembranças, pois
quando criança não sabia o devido valor daquele verde, no escuro, mas já
gostava. 

    Nuvens e lua




Quando o meu pai contava histórias com os vizinhos, ficávamos deitados no chão olhando a lua, ao redor deles, a lua parecia conhecer a gente, ela nos olhava e as nuvens a encobriam, ela brincava de esconde-esconde, o chão forrado com aqueles sacos macios, sabiam do nosso sono, dormíamos, assim. Eu dormia com a lua.
Nos meus sonhos ela era diferente.

Fogão à lenha



Quando entrávamos, era a luz de lamparinas que tínhamos, algum tempo depois, lampiões, a energia elétrica era algo bem distante.
Bem como o nosso café, enfim toda a refeição era feita no fogão à lenha, 
As chamas e as brasas era muito bonito, eu gostava.
Porém, enquanto fumegava, eu disso não gostava, não suportava o cheiro da fumaça, via a aflição deles querendo logo que viesse o fogo e depois ele apagava e mais lenha mais fumaça...
Sempre detestei cigarros e fumaças de todo jeito, até de fogão à lenha, sendo o cigarro ainda muito pior, o antigo, de fumo mesmo e nem esses modernos... Não suporto até hoje, acho cigarros primitivismo e desumano até, é de muito mal gosto encher os seus pulmões de fumaças.
Naquele período, vinha da serra muitas frutas, legumes, nesse tempo os meus pais já haviam deixado de plantar à beira do rio Cocó, não tinham tempo, pois precisavam ganhar mais dinheiro, o meu avó Marcolino que continuou morando lá na serra, e os irmãos do meu pai que ficaram pela serra, sempre traziam no caminhão muita fartura. O que compramos hoje aos poucos, vinha naquele tempo em fardos de legumes, arroz, feijão, milho, banana, rapadura, E passávamos muito tempo sem comprarmos mantimentos para sobrevivermos.
O papai comprava café, ainda para ser pilado, lembro dos tachos enormes e a minha avó torrando os grãos de café, eles iam se derretendo e soltando um líquido grosso tipo mel muito escuro não sei, não lembro o processo todo...
Lembro depois ela colocando a massa escura do café em algum lugar que se apagou da minha memória, mas do gosto eu lembro, com pão passado na manteiga, ou com nata do leite... De cabra, sim, fui criada com leite de cabra,
Pensando assim, me sinto ainda mais velha entrando no miundo das minhas memórias tão antigas e tão presente aqui.

Vida nova



Com o passar do tempo os meus pais construíram uma casa bem maior, de alvenaria.Uma festa! A casa construída por toda a família, o cheiro do cimento era marcante, antes um chão batido, passou à ter cobertura diferente,
o pai era o pedreiro e os ajudantes eram a sua mãe a avó e os seus irmãos mais velhos. A casa ficou pronta, dessa vez a civilização estava entrando naquele lugar,
Ficávamos os quatros em cima de bancos, na janela, engolindo poeira, para vermos os tratores alargando ainda mais a rua... Iriam calçar a nossa rua, chorávamos porque não teríamos mais os rios e barreiras que construíamos 
para esperarmos as chuvas, quando havia inverno. Crianças inocentes,
Nem sabíamos o valor de tudo aquilo.
Estava chegando um novo tempo... 










 
Continua...













 
Liduina do Nascimento
Enviado por Liduina do Nascimento em 30/09/2016
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