As estações da alma.
A alma voa, deixando por onde passa... os seus rastros em forma de poesia.
Textos







ANÔNIMA


 

Sabe aquela vontade de viver mais intensamente, de dar atenção, ouvir e de caminhar calmamente pelas ruas sem pressa de chegar, desses passeios matinais ou dos finais de tarde, que sem pretensão nenhuma fazemos, depois parar em um banco de uma praça qualquer, e ouvir os gritos das crianças correndo, brincando, com o fundo musical da passarada em festa, de céu azul, de ipês de todas as cores, e leveza. Não podendo, voo em pensamentos para me certificar de que fiz tudo certo, ou nem tudo. O bairro em que eu nasci, foi trocado de nome duas vezes, inclusive as suas ruas também uma a uma, foram trocados os seus nomes, algumas levaram os nomes de seus próprios filhos ilustres, os becos viraram ruas, e algumas ruas muito estreitas foram alargadas e se tornaram avenidas, e naquelas mudanças e homenagens... a antiga rendeira, de uma daquelas ruas, próximo ao colégio que quando eu era criança estudei, todas as manhãs, ela colocava na sua calçada uma cadeira, a mesinha, a sua almofada dura, com seus bilros e espinhos de fazer acontecer, e começava a tecer as rendas brancas com flores lindas, e calada ela mexia com as linhas e o bordado ia chamando à atenção de quem por ali passasse... Na verdade estou falando no tempo passado, só que ela continua fazendo as suas rendas por lá até hoje, todas as manhãs, sentada à frente do portão da sua casa. Não sei qual é a sua idade, nunca ouvi a voz dela, e nunca soube o seu nome, e hoje não sei se por efeito de certa forma, das reflexões desses últimos tempos, sobre o que fiz e o que deixei de fazer, não sei, tem coisas que por mais que eu viva, nunca irei me compreender... senti remorso por nunca haver parado e conversado com ela, espero que ainda dê tempo de me aproximar dela, qualquer dia desses quando eu for visitar a minha mãe, eu vou parar em frente a casa dela, mesmo de longe, vou elogiar o trabalho daquela mulher rendeira, e vou perguntar qual o nome dela, vou tirar a máscara, e lhe dar um sorriso, espero que ela nem tente compreender os meus motivos, e me responda, pois tenho certeza que ela me conhece desde menina, ela vai achar muito estranho que depois de tanto tempo eu tenha essa atitude, ou quem sabe ela nem me responda. O que ela não sabe é que se eu tivesse o poder de mudar um nome de rua que fosse, eu mudaria o nome da rua em que ela mora, para Rua Da Mulher Rendeira.

                            
Liduina do Nascimento
Enviado por Liduina do Nascimento em 12/05/2021
Copyright © 2021. Todos os direitos reservados.
Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor.